05/03/2013

PT e movimentos LGBT repudiam indicação de pastor para comissão da Câmara Federal

Indicação de Marco Feliciano foi recebida com indignação por movimentos ligados à causa LGBT | Foto: Brizza Cavalcante/Ag.Câmara
Rachel Duarte
A bancada do PT estará reunida na terça-feira (5) para discutir a indicação do Partido Social Cristão (PSC) para a presidência da Comissão de Direitos Humanos da Câmara Federal. Para os petistas, a indicação do deputado federal Marco Feliciano (PSC-SP) para presidir a comissão é inaceitável, uma vez que o pastor teria posições consideraDas preconceituosas e discriminatórias. O movimento LGBT é um dos mais preocupados com o retrocesso que acreditam que seria consequência da indicação. Em nota, os ativistas se declararam surpresos com a indicação e repudiaram o nome do parlamentar.
A principal crítica não se refere ao PSC, mas à figura do pastor Marco Feliciano. Registros em vídeo e nas redes sociais atestam que Feliciano tem posições contrárias aos anseios da comunidade LGBT. Em 2011, ele escreveu em sua conta no Twitter que relações homossexuais levam "ao ódio, ao crime e à rejeição". Na época, ele disse também que afrodescendentes eram descendentes "amaldiçoados" de Noé. Além disso, disse que a ex-senadora e atual ministra da Cultura, Marta Suplicy (PT) e a deputada federal Érica Kokay (PT-DF), defensoras do PLC 122 que prevê a criminalização do crime de homofobia, são "mulheres com sexualidade distorcida".
Desviando da acusação que considera 'obscurantismo', Érica Kokay disse ao Sul21 que a indicação do pastor é inadmissível e uma ameaça à democracia. "Ele (Marco Feliciano) é uma ameaça à Constituição Federal. Todo o obscurantismo é ignorante. Além de destruir a imagem e o trabalho da Comissão de Direitos Humanos da Câmara Federal, seu nome irá prejudicar o país internacionalmente", avalia a deputada.
"Organismos internacionais de Direitos Humanos estão preocupados", diz deputada
Em um momento em que organismos internacionais de defesa dos direitos humanos estão cada vez mais consolidados no enfrentamento das violações ocorridas nos países, o Brasil escolher um nome que pode impor preceitos religiosos para legislar é uma afronta, complementou Érica Kokay. "Existem organismos que já se comunicaram conosco e estão preocupadíssimos com o futuro desta comissão. Por isso que convocamos uma reunião com o PT", afirmou.
Deputada federal Erika Kokay diz que mesa está avisada sobre falta de consenso para votar o nome de Marco Feliciano | Foto: Agência Câmara.
Diante da polêmica em relação ao nome de Feliciano, o próprio PSC estaria trabalhando nos bastidores para indicar outro nome para a presidência da comissão. O partido evita divulgar esse nome para evitar novas polêmicas. OSul21 tentou contato com o líder do PSC na Câmara, deputado federal André Moura, e não teve retorno até o fechamento desta matéria.
Na reunião desta terça-feira, Erika Kokay e demais deputados do PT que compõe a comissão, como Nilmário Miranda (PT-MG) e Luiz Couto (PT-PB), cobrarão explicações do líder do partido na casa José Guimarães (PT-CE) pelo fato de o PT ter perdido o comando da comissão. O rodízio entre os partidos com maior bancada ocorre anualmente e, embora a presidência da Comissão de Direitos Humanos ter sido do PT em 2012, o partido teria aberto mão para negociar outras comissões que considera prioritáriaS.
De acordo com o deputado federal Domingos Dutra (PT), que está deixando a Comissão dos Direitos Humanos, "a Comissão de Constituição e Justiça foi a prioridade nas escolhas do PT". O partido também optou pela Comissão de Seguridade e Saúde e pela de Relações Exteriores. "Não sabemos, porque não falei com o líder ainda, se foi o PSC que saiu na frente em pedir a Comissão de Direitos Humanos antes do PT ou se o PT abriu mão por alguma outra. De qualquer forma, a negociação sobre o nome e o vice ainda será feita", disse.
A indicação tem que ser votada pelos membros da Comissão, o que já está declarado que não irá ocorrer se o nome indicado for o do pastor Marco Feliciano. "A Comissão de Seguridade e Saúde é importante porque a bancada fundamentalista pretende mudar o Conselho de Psicologia para a 'cura gay' nesta comissão. Ficando com o PT é bom para evitar este absurdo. Porém, já avisei ao vice-presidente da mesa que não vamos votar o nome dele (Feliciano) para Direitos Humanos. Se houve a negociação das comissões, que seja ao menos um nome de maior consenso", defende a deputada .
 
ABGLT pretende esvaziar funções da Comissão se PSC e PT não mudarem indicação do pastor
Deputado federal Marco Feliciano é contra o PLC 122 e participou de ato contrário ao texto em frente ao Congresso Nacional | Montagem: marcofeliciano2010.com.br
Além do PL 122, outros projetos referentes aos direitos da população LGBT podem estar ameaçados com mudança na presidência da Comissão de Direitos Humanos. A Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT), que congrega 284 organizações em todo território brasileiro, publicou nota com indignação ao nome indicado pelo PSC.
"O parlamentar indicado para presidir a mencionada CDHM tem feito reiterados pronunciamentos públicos na contramão dos objetivos primordiais desta comissão. Em mais de uma ocasião, teceu comentários depreciativos à população LGBT, mostrando-se totalmente refratário ao reconhecimento dos direitos destas pessoas. Na contramão do entendimento do Supremo Tribunal Federal, que através da aprovação da ADI 4277 e da ADPF 132, declarou publicamente a legitimidade da existência de pessoas LGBT em nossa sociedade, em face de princípios constitucionais pétreos, a saber: a liberdade, a igualdade, a isonomia e a não discriminação", defendeu a entidade.
Para o secretário de Educação da ABGLT, Toni Reis, a negociação para o futuro presidente da CDHM com o movimento social girava em torno de nomes do PT. "Temos confiança na relação dos parlamentares do PT com este tema. Eles têm mais atenção a isso. Quando soubemos que eles preferiram a Comissão de Relações Exteriores ficamos chocados. Mais ainda quando soubemos que seria o Marco Feliciano (indicado à Comissão de Direitos Humanos). Tem vídeosdele onde se confirma que ele é homofóbico, racista, aidsfóbico. Será uma vergonha e um desastre para o Congresso Brasileiro. É como colocar lobo cuidando de ovelhas. Ele não tem sensibilidade nenhuma com este tema e usa uma argumentação esdrúxula. Esperamos que o PT e o próprio PSC revejam esta posição", cobrou.
Caso a indicação de Marco Feliciano seja mantida, o movimento estuda boicotar a Comissão de Direitos Humanos a ponto de esvaziá-la das decisões que toquem os temas fundamentais para os direitos LGBT. "Vamos deixar de participar desta comissão. Todos os projetos serão redirecionados para outras e seguirão direto para plenário", disse.
Existem outras ações como as ligadas às comunidades quilombolas e ao combate ao trabalho escravo, que também podem ser afetados com a mudança na presidência da Comissão de Direitos Humanos. Para o deputado federal Domingos Dutra (PT) a indicação de Marco Feliciano faz parte de um plano da bancada evangélica para se unir à bancada ruralista e fortalecer a atuação conjunta no Congresso. "Eles articularam para dominar a Comissão de Agricultura e de Direitos Humanos. Nós precisamos é mudar esta relação de forças no parlamento, elegendo deputados indígenas, mais negros, mais mulheres", fala. Para ele, mais do que a presidência de uma comissão, a relação de forças é o principal entrave dos temas das minorias no Congresso Nacional. "Hoje só vai à plenário aquilo que tem consenso. Isto deixa tudo engessado. Se não temos maioria sobre um tema, não temos acordo. O projeto de combate à tortura discutido pelo Executivo, por exemplo, está engavetado na Comissão de Direitos Humanos", exemplificou.

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