10/03/2013

Professora demitida por ser lésbica receberá indenização

Zana Zaidan

A professora aposentada Carmem Silvia Geraldo, de 57 anos, ganhou ação contra o município de Campo Grande, por ter sido afastada do cargo na Escola Municipal Onira dos Santos, na zona rural da Capital. Carmem mantinha um relacionamento homoafetivo com Noyr Randora Marques, que lecionava na mesma escola e também foi demitida, em uma clara atitude arbitrária e homofóbica da Secretaria Municipal de Educação (Semed), então administrada pelo prefeito Nelson Trad Filho (PMDB) e o secretário de Educação, Volmar Vicente Filippin.
Hoje, seis anos após ingressar com uma ação contra o município, a decisão favorável à Carmem foi publicada no Diário de Justiça de MS, e a Terceira Câmara Cível de juízes determinou o pagamento de R$ 30 mil por danos morais à Carmem. Para ela, fica de lição para todas as mulheres e homossexuais que existe punição para atos discriminatórios como o sofrido por ela. "Corram atrás de seus direitos. Pode levar tempo, como demorou para mim, mas, a justiça foi feita. Mais do que a parte financeira, o importante foi provar que eu era um boa profissional, e não tinha feito nada de errado para ser demitida", acredita.
O relato de Carmem e Noyr remete ao sentimento de impotência e indignação diante da perda do emprego, e à repressão dos próprios colegas de trabalho. Carmem começou a lecionar na escola em janeiro de 2007. À época, mantinha um relacionamento com Noyr há cerca de oito meses. Como a escola ficava afastada de Campo Grande, os funcionários moravam em um alojamento, no mesmo local. "Nossa equipe era composta por três professoras: eu, Noyr e Maria de Jesus, e mais dois professores. Sempre tive um bom relacionamento com todos, inclusive com a coordenadora e a diretora da escola", conta.
O erro, segundo Carmem, foi confiar demais em Maria de Jesus. Após três meses de trabalho na escola, Carmem contou para a colega que se relacionava com Noyr. "Nós três passávamos o dia juntas, e isso passava uma sensação de cumplicidade. Eu pedi para ela não comentar com ninguém, mas, talvez por inveja da nossa felicidade, ela contou para a irmã da diretora da escola, porque sabia que o namoro chegaria no ouvido dela".
A partir de então, teve início o "período mais turbulento" na vida de Carmem e Noyr. A diretora fez com que os funcionários da escola assinassem uma ata, em que o pedido da demissão de ambas era solicitado. "Ela encaminhou o documento para a Semed, que deu a orientação para se livrar de nós duas", conta Carmem que, por ser concursada, foi afastada do cargo, sob alegação de "demonstração de prática de atos incompatíveis com a função de educadora". Noyr, que era contratada do município, foi demitida sem justa causa. As duas garantem que nenhum dos 100 alunos que frequentavam a escola na época sabiam do relacionamento das professoras. "Ninguém sabia, nem os próprios professores. Éramos extremamente profissionais, e só tínhamos envolvimento fora do horário de trabalho. Foi um choque muito grande", garante Noyr.
Vitória veio apenas seis anos depois
Em 2008, Carmem optou por ingressar com uma ação contra o município. Ela pediu R$ 500 mil por danos morais, alegando a "ausência de procedimentos administrativos obrigatórios a administração municipal". "Na realidade, o valor que vou receber (R$ 30 mil) é irrisório, quando penso em tudo que passei. Dói muito, não dá para mensurar a dor", diz Carmem.
Noyr também entrou com uma ação no Ministério do Trabalho e, assim como no caso de Carmem, a prefeitura recorreu por diversas, e ela aguarda o resultado. "Ainda cabe recurso, mas, estou confiante de que, assim como chegou a vez da Carmem, a justiça também será feita por mim. Fico muito feliz pela decisão da justiça e sei que essa vitória não é só dela, é de todos os homossexuais e mulheres do país", comemora Noyr.
Hoje, as professoras não estão mais juntas - Carmem reside em Campo Grande e Noyr em Miranda, no interior do Estado - mas, garantem que os problemas fortaleceram o relacionamento e que elas pretendem continuar amigas.


Procurados pela reportagem, o então secretário de Educação e o ex-prefeito Nelson Trad Filho não quiseram comentar o caso.

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