10/04/2011

DOMINGO: Batida policial na Cidade Baixa – uma ação anunciada


Após a reportagem de ZH da última segunda-feira, intitulada: “Sem Limites – Vandalismo, Sexo e Drogas a Céu Aberto”, denunciada como homofóbica neste blog, fizemos algumas ações e participamos de uma reunião (na sexta-feira, dia 08) com o GT-LOS - Grupo de Trabalho sobre Livre Orientação Sexual - da Prefeitura de Porto Alegre.
Nossa maior preocupação nesta reunião, além da vinculação feita pela reportagem com as lésbicas e gays que frequentam a Cidade Baixa – vinculação não intencional, segundo e-mail que recebemos de um dos jornalistas que assinavam a matéria, mas que, na nossa opinião, foi direta e reforçada pelas fotos de beijos homossexuais – era com a segurança da população jovem que frequenta aquela área. Sobretudo porque sabíamos, como afirmamos várias vezes naquela reunião, que a BM faria alguma ação na Cidade Baixa neste final de semana e nos preocupava saber qual a orientação do ESTADO caso a ação ocorresse, sobretudo porque pressionados pelo poder de circulação do veículo que publicou a matéria.

O Papel da Imprensa:
Para nós a imprensa tem o dever de explicitar em suas matérias os problemas que existem por toda a cidade, mas uma reportagem pressupõe ouvir todos os lados de um problema, sobretudo em regiões de conflitos sociais – como é o caso da cidade baixa, em função da tentativa de expulsar de lá gays e lésbicas que começou com a concentração em frente ao Shopping Olaria há alguns anos e que, hoje, se estende a todos os jovens de baixa renda que consomem álcool nas calçadas e não nos bares.
Uma reportagem parcial, que retrata jovens como vândalos, inimigos da população local e que faz uma vinculação destes problemas com a homossexualidade presta um desserviço a todos o trabalho que fazemos diariamente na afirmação positiva dos LGBTs, buscando o fim do preconceito e da homofobia (que tem matado centenas) e o avanço nos direitos para nossa população.

O Papel do Estado
Esta população jovem, que frequenta a redenção durante o dia, e para a qual faltam políticas sociais, espaços de socialização, opções culturais, não é inimiga de qualquer cidadão adulto de qualquer parte da cidade. É, na verdade, vítima da falta de ação do Estado que os deixa sujeitos aos excessos próprios da fase em que vivem, onde transgredir é parte do processo de crescimento pelo qual estão passando.
O Estado, no entanto, ao invés de voltar sua preocupação para a juventude, para seu desenvolvimento intelectual, social, cultural, cede às pressões dos comerciantes da área e tenta, através da repressão policial, expulsá-los das ruas da Cidade Baixa.
Enquanto isso, nos arredores do Parque da Redenção, dezenas de jovens universitários estão à merce de assaltos e violações de direitos, justamente porque o Estado não está presente e a imprensa não se importa.
Gostaria de ter acesso às estatísticas de assaltos nos arredores da Lima e Silva e compará-los com as mesmas estatísticas nos arredores da Redenção. Tenho certeza que a ação policial seria mais útil perto da universidade do que perto dos bares da Cidade Baixa.

O Papel da Polícia
Me pergunto qual o resultado que uma ação – anunciada e sem planejamento como a de hoje – tem do ponto de vista prático para resolver os problemas que são apontados na Cidade Baixa?
Sabendo que a ação ocorreria e sem as repostas que formos buscar na reunião de sexta-feira (que era: qual a orientação para a abordagem policial), nos organizamos e formos para a rua neste domingo ao final da tarde.
Chegamos na Lima e Silva, junto com o Batalhão da BM que foi deslocado para aquela área (por volta das 19h30min).
Apesar da chegada cinematográfica, a abordagem policial não foi violenta, ao contrário, todos os policiais – a exceção de um, cuja foto gostaria de ver na reportagem de ZH de amanhã, que sacou uma arma – foram bastante comedidos na abordagem aos jovens.
Claro que a presença da reportagem que acompanhava a “ação policial” pode ter facilitado esta postura. Aliás, fiquei pensando: porque um repórter, da mesma rede que publicou a matéria de segunda-feira, chegou com os policiais na ação?
Bem... Os jovens foram colocados contra a parede, questionados e revistados, sem que nada fosse encontrado. Alguns saíam perguntando: “gente, o que é isso aqui hoje?”
Nós acompanhávamos tudo de perto – fomos até fotografas por uma policial que carregava uma câmera portatil – e falávamos com a garotada após a revista para tranquilizá-los e ver como se sentiram.
O batalhão caminhava de um lado para o outro – a concentração dos jovens já era bem menor - quando, de repente 04 ou 05 rapazes começaram uma briga na calçada em frente ao supermercado, do lado contrário da calçada, bem em frente ao maior grupo de policiais.
Quatro ou cinco policiais atravessaram a rua – um deles, que espero ver nas fotos de amanhã, na reportagem que certamente haverá na ZH – com uma arma em punho, gritando: “Separa, Separa, Separa!” .... mas ele foi logo afastado por outro colega, enquanto a gurizada foi jogada contra a parede.
A Câmera do repórter que acompanha a “ação policial” ficou frenética, disparou vários tiros, digo, tiros do obturador da câmera, contra os adolescentes. Quatro foram presos os outros liberados e aí.....
Aí a “ação policial” acabou! Todos foram embora e a Cidade Baixa retomou seu ritmo normal (eram, mais ou menos, 20h30min).

O Papel da Imprensa II
Quando saí de lá, fiquei com a nítida impressão de que a “ação policial” da Cidade Baixa estava a serviço do repórter que acompanhava a ação.
Ação que, achadas as drogas – que imagino devem ter sido achadas com os 04 que foram presos - a briga (vandalismo) citados na segunda-feira, acabou tão rapidamente como começou.
Claro que isso é uma “viagem” de militante de direitos humanos!
Esperem a ZH de amanhã e voltamos a discutir na terça-feira.
Torço - torço mesmo! - para estar errada, porque seria colocar o Estado e toda uma corporação da maior importância – de joelhos para um veículo de comunicação, mas não, isso é “viagem” de militante de direitos humanos!

O Papel do Estado II
Esperávamos encontrar na Cidade Baixa os agentes da Prefeitura e do Governo do Estado, presentes na reunião de sexta-feira, já que todos afirmaram ter as mesmas preocupações que nós manifestávamos.
Estes agentes, no entanto, não estavam lá! Estavam os policiais que representam a força repressiva do Estado, o monopólio da violência – que se não foi física, foi moral!

O Papel dos Movimentos Sociais
A nós, movimentos sociais – infelizmente éramos tão poucos - cabe fazermos o que fizemos hoje: acompanhar as ações anunciadas da BM e garantir um tratamento decente para esta gurizada. Cobrar do poder público as ações que efetivamente resolverão os problemas e os excessos cometidos em todos os cantos da cidade e a proteção que garantirá sua circulação na Cidade Baixa e na Cidade inteira.
Quanto à ZH: nós estávamos lá .... e estamos de olho!

Nenhum comentário: