08/10/2011

MPF processa TV Correio e apresentador por exibição de cenas de estupro de menor

http://www.prpb.mpf.gov.br/news/mpf-processa-tv-correio-e-apresentador-por-exibicao-de-cenas-de-estupro-de-menor

07/10/2011 - 08h30

MPF processa TV Correio e apresentador por exibição de cenas de estupro de menor

O Ministério Público Federal na Paraíba (MPF) propôs ontem, 6, ação
civil pública com pedido de liminar contra a TV Correio (repetidora da
TV Record na Paraíba) e o apresentador do programa Correio Verdade,
Samuel de Paiva Henrique (conhecido pela alcunha de Samuka Duarte), em
virtude da exibição de cenas reais do estupro de uma menor ocorrido em
Bayeux (PB). As cenas, filmadas com o uso de um celular por um
comparsa do autor da violência, foram exibidas no programa da última
sexta-feira, 30 de setembro. A ação também foi proposta contra a
União.

Segundo a ação, "não se encontraria, no país inteiro, exemplo mais
cabal de exploração da miséria humana, da sexualidade pervertida, de
desrespeito com os valores da sociedade e da família e de atropelo da
dignidade de uma criança por meio de veículo de comunicação, do que
este". Tais cenas, disfarçadas com recurso de tênue desfoque,
mostradas no horário do almoço, "transformam a casa de milhares de
cidadãos paraibanos em palco para a sexualidade pervertida e
criminosa, além de tripudiar com a dignidade e os direitos da
personalidade da infeliz vítima".

A ação destaca que, como forma de atrair o público, especialmente o
infantil, "estas cenas foram anunciadas e repetidas durante todo o
horário de exibição - de 12h às 13h, do dia 30 de setembro, como a
maior 'atração' do dia, com frequentes inserções de parte do vídeo que
mostrava a adolescente sendo despida, com promessas que a filmagem
completa seria mostrada no final do programa (o que de fato ocorreu, a
partir das 12h50), quando o apresentador chegou ao paroxismo da
histeria".

Estupro como atração - Em outro trecho da ação consta que, às 12h29, o
apresentador exclamou: "'Atenção! Vocês vão ver uma história de
estarrecer... uma estudante de treze anos... violentada... tudo foi
filmado... Vocês aguardem porque as imagens vocês vão ver aqui como
foi. São chocantes!' (...) Às 12h34 é exibida a cena da desnudez,
enquanto o apresentador descreve: 'Olha o cara tirando a roupa dela
aí, ó. Só um trechinho. Depois a gente vai mostrar tudo'. Às 12h41,
exibição de novas cenas do crime e descrições (...) 'Ela tá deitada',
'Tá como se estivesse dopada'. Finalmente, chega o gran finale. Às
12h54, o apresentador afirma que irá 'mostrar agora' cenas que irão
'chocar a Paraíba'. Cinicamente, pede 'que as crianças saiam da sala',
o que não o impede de continuar apelando: 'Atenção que nós vamos
mostrar agora'".

Na ação, o Ministério Público Federal defende que a exibição dessas
cenas, mesmo com o desfoque, é inteiramente proibida pelo Estatuto da
Criança e do Adolescente.

Ofensa à dignidade - No caso do programa Correio Verdade, o MPF
entende que "uma concessão pública foi utilizada como instrumento da
violação de direitos fundamentais da pessoa humana, e exatamente do
segmento mais fragilizado da sociedade – as crianças e adolescentes.
Nenhuma justificativa de informação pública pode socorrer os autores
de tamanha afronta, absolutamente desnecessária, que ofendeu a
dignidade da pobre vítima, ampliando seus ultrajes e vergonha, e a
dignidade dos telespectadores, transformados, em pleno horário do meio
dia, em espectadores de um 'snuff movie' que seria proibido até mesmo
no horário da madrugada ou no mais recôndito dos cinemas pornôs".

Ainda na ação, o MPF cita recente proibição, pela Justiça Federal, de
exibição de filme, de procedência sérvia, que em uma das cenas
simulava o estupro de um bebê (foi utilizado um boneco) e questiona:
"O que se dizer, então, da TV aberta que exibe em pleno meio dia cenas
de um estupro real, precedidas de inúmeros 'trailers' apelativos com
parte das cenas e chamadas do apresentador? (...) O que falta para a
TV Correio em seu vale tudo pela audiência? Exibir cenas reais do
estupro de um bebê - posto que de criança já exibiu – a pretexto de
'informação'?

Violação de imagem - A ação fundamenta-se na violação do direito à
imagem (que no caso, por se tratar de crime, nem com autorização dos
responsáveis poderia ser exibida publicamente), do direito à
intimidade e à honra da criança vítima - que pode ser perfeitamente
identificada no meio em que vive - para pedir condenação do
apresentador e da emissora, em prol da menor, no valor de R$ 500 mil.
"A infelicidade de um crime não torna o corpo da vítima objeto do
domínio público para que os réus dele possam servir-se com fins
lucrativos", defende o procurador da República Duciran Farena, que
subscreve a ação.

Danos morais - São pedidos também na ação danos morais coletivos,
sofridos pela sociedade com a exibição da cena, no valor de cinco
milhões de reais, que serão revertidos ao Fundo Municipal da Criança e
do Adolescente das cidades de João Pessoa e Bayeux. Liminarmente,
pede-se também que a emissora seja compelida a abster-se de exibir no
programa qualquer imagem de menor, seja vítima de crimes, seja menor
em conflito com a lei.

Cassação da concessão - Contra a União, pede-se o monitoramento dos
programas transmitidos pela TV Correio, a suspensão - por 15 quinze
dias - do programa Correio Verdade e a cassação da concessão. A União,
como titular da concessão de radiodifusão, ainda responderá
subsidiariamente pelas indenizações, no caso de falência ou
desaparecimento dos réus.

Outras providências - O procurador também anunciou que outras
providências serão tomadas com relação ao programa Correio Verdade,
como recomendações aos patrocinadores para que suspendam a publicidade
no programa e à própria TV Record, para que impeça a retransmissão de
sua programação pela afiliada TV Correio.

Classificação indicativa - O Ministério Público Federal vem
acompanhando o problema da inadequação do conteúdo dos programas
policiais sensacionalistas para o horário em que são exibidos na
Paraíba (entre 12h e 13h), por meio do Inquérito Civil Público nº
1.24.000.00706/2007-69. Em agosto foi solicitado às emissoras,
inclusive à TV Correio, um compromisso de que ajustariam sua
programação à classificação indicativa do Ministério da Justiça
(Portarias MJ nº 1.100/2006 e nº 1.220/2007).

A despeito da TV Correio ter subscrito - com as demais emissoras -
documento reafirmando seu respeito às diretrizes delineadas pela
Portaria Ministerial MJ nº 1.220/2007, "o conteúdo do programa Correio
Verdade somente tem piorado, chegando ao cúmulo do intolerável com a
exibição das cenas do estupro", conforme declarou o procurador Duciran
Farena.

O procurador informou que aguarda apenas análise do conteúdo do
programa Correio Verdade, pelo Ministério da Justiça, para ingressar
com nova ação com vistas a responsabilizar a empresa pelo
descumprimento da classificação indicativa.

O valor da causa é de R$ 5.500.000,00.

Ação Civil Pública nº 0007809-20.2011.4.05.8200 ajuizada em 06/10/2011.

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